AQUARELA, GEOMETRIA E ARTETERAPIA
Por Flávia Hargreaves
atelie.locus@gmail.com
O que podemos aprender trazendo esta perspectiva, esta mudança de atitude diante da aquarela para a nossa pratica em Arteterapia? Ao invés de usá-la com o intuito de “soltar”, poderíamos lançar-nos no desafio de “controlar” o que tende a “fugir ao controle”, buscando soluções técnicas e criativas para estas situações?
“Não há espaço para indecisões” remete à necessidade que em certos momentos da vida somos chamados a fazer escolhas sem hesitação, chamar a função pensamento para conter afetos fora de controle. Diante de uma matéria que insiste em expandir, escorrer, vazar, o artista/cliente precisa buscar meios de conter os “excessos” e os “transbordamentos”.
Decidi pessoalmente experimentar este modo de pintar a aquarela trazendo a geometria para traçar as linhas de base, trazendo a regra, a estrutura como pano de fundo para a aquarela. Aquarelas geométricas já foram muito exploradas em arte, como podemos observar na obra de Paul Klee. Mas voltando à Arteterapia, minha experimentação parte da contradição inicial de um material fluido, que escapa, e da geometria que remete ao controle e à permanência. Mergulhei nesta tarefa de trabalhar a aquarela com as limitações de contornos retos e circulares.
A geometria traçava um ponto de partida, com réguas, esquadros e compasso. Eles me deram segurança para iniciar, mas não fui inflexível no respeito às linhas traçadas, nem tampouco as abandonei ou as perdi de vista. Fui maleável, permitindo algum transbordamento aqui e ali. Depois de alguns ensaios, liberei as mãos da régua e do compasso e segui construindo minhas formas retas e circulares à mão “livre”. As palavras são sempre sugestivas...
Esta experiência, me fez retomar um tema que me é muito caro, o uso dos materiais em Arteterapia. Acredito ser fundamental que o arteterapeuta se experimente no diálogo com os materiais, sem preconceitos, explorando suas técnicas e abordagens tradicionais e pesquisando e experimentando novas possibilidades. O desafio passou a ser ficar no material, não pular de um para o outro, de uma técnica para outra. Ficar no material, insistir, para dar espaço para que o material mostre suas contradições.
O mesmo material poderá servir de meio para caminhos opostos. Ao perceber o transbordamento de suas emoções, o descontrole, que se desdobra em situações que trazem sofrimento, a utilização de uma técnica aguada em Arteterapia poderá tornar visível esta situação. E o mesmo material poderá ser trabalhado no sentido de transformar esta relação com as emoções, organizando, dando um sentido, um continente, usando a aquarela a partir da perspectiva de conter os excessos, dar uma direção, etc. E isto será possível tecnicamente compreendendo a dinâmica das áreas secas e úmidas. Não precisamos mudar o material, mas insistir nele, afinal estamos diante do mesmo indivíduo, com o mesmo material.
O desafio de “ficar no material” foi proposto aos participantes do Grupo de Estudos em Arteterapia, que coordeno com Maria Cristina de Resende, e no curso “Conhecendo os materiais e aprendendo a usá-los”.
_______________________________________________________________________________
atelie.locus@gmail.com
Está claro que a qualidade de fluidez deste material não é colocada em questão, mas a afirmação acima deve saltar aos olhos dos arteterapeutas. Percebo uma contradição entre o olhar do artista e o do arteterapeuta, que parte desta fluidez para propor justamente o “deixar fluir”, direcionando as técnicas com tintas diluídas, aguadas para pessoas enrijecidas, colocando-as em contato com o fato de que não é possível manter a vida, as emoções sob controle, etc.Nas palavras da artista e professora Lourdes Barreto, a aquarela“[...] essa matéria fluida colorida deve ser dominada,controlada, seguida, sem espaço para indecisões.”
O que podemos aprender trazendo esta perspectiva, esta mudança de atitude diante da aquarela para a nossa pratica em Arteterapia? Ao invés de usá-la com o intuito de “soltar”, poderíamos lançar-nos no desafio de “controlar” o que tende a “fugir ao controle”, buscando soluções técnicas e criativas para estas situações?
“Não há espaço para indecisões” remete à necessidade que em certos momentos da vida somos chamados a fazer escolhas sem hesitação, chamar a função pensamento para conter afetos fora de controle. Diante de uma matéria que insiste em expandir, escorrer, vazar, o artista/cliente precisa buscar meios de conter os “excessos” e os “transbordamentos”.
Decidi pessoalmente experimentar este modo de pintar a aquarela trazendo a geometria para traçar as linhas de base, trazendo a regra, a estrutura como pano de fundo para a aquarela. Aquarelas geométricas já foram muito exploradas em arte, como podemos observar na obra de Paul Klee. Mas voltando à Arteterapia, minha experimentação parte da contradição inicial de um material fluido, que escapa, e da geometria que remete ao controle e à permanência. Mergulhei nesta tarefa de trabalhar a aquarela com as limitações de contornos retos e circulares.
A geometria traçava um ponto de partida, com réguas, esquadros e compasso. Eles me deram segurança para iniciar, mas não fui inflexível no respeito às linhas traçadas, nem tampouco as abandonei ou as perdi de vista. Fui maleável, permitindo algum transbordamento aqui e ali. Depois de alguns ensaios, liberei as mãos da régua e do compasso e segui construindo minhas formas retas e circulares à mão “livre”. As palavras são sempre sugestivas...
Esta experiência, me fez retomar um tema que me é muito caro, o uso dos materiais em Arteterapia. Acredito ser fundamental que o arteterapeuta se experimente no diálogo com os materiais, sem preconceitos, explorando suas técnicas e abordagens tradicionais e pesquisando e experimentando novas possibilidades. O desafio passou a ser ficar no material, não pular de um para o outro, de uma técnica para outra. Ficar no material, insistir, para dar espaço para que o material mostre suas contradições.
O mesmo material poderá servir de meio para caminhos opostos. Ao perceber o transbordamento de suas emoções, o descontrole, que se desdobra em situações que trazem sofrimento, a utilização de uma técnica aguada em Arteterapia poderá tornar visível esta situação. E o mesmo material poderá ser trabalhado no sentido de transformar esta relação com as emoções, organizando, dando um sentido, um continente, usando a aquarela a partir da perspectiva de conter os excessos, dar uma direção, etc. E isto será possível tecnicamente compreendendo a dinâmica das áreas secas e úmidas. Não precisamos mudar o material, mas insistir nele, afinal estamos diante do mesmo indivíduo, com o mesmo material.
O desafio de “ficar no material” foi proposto aos participantes do Grupo de Estudos em Arteterapia, que coordeno com Maria Cristina de Resende, e no curso “Conhecendo os materiais e aprendendo a usá-los”.
_______________________________________________________________________________
texto publicado originalmente em 29/06/2015: http://nao-palavra.blogspot.com.br/
Comentários
Postar um comentário