MINHAS REFLEXÕES COMO ARTETERAPEUTA SOBRE A PANDEMIA
por Flávia Hargreaves
Revisão Erica Kohler
Flávia Hargreaves, selfie de 2021. A pintura em destaque foi realizada no Grupo Pintando e Bordando os Arcanos Maiores do Tarô em 2018. |
Em
abril de 2021 fui convidada a participar do webinar TRAVESSIAS – 16o Encontro
Criativo Territórios Expressivos[1] – a convite de Ângela
Philippini, diretora da Clínica Pomar, ao lado dos arteterapeutas Ana
Monteiro (Lisboa - Portugal), Bernardo Arraes (Rio de Janeiro - Brasil) e Cecilia
Byrne (Viña del Mar - Chile), com
a participação de Robson Xavier como debatedor (João Pessoa -
Brasil). O tema central era o compartilhamento de experiências e estratégias
em Arteterapia capazes de auxiliar no fortalecimento da capacidade de
resiliência das pessoas diante do prolongamento e agravamento da pandemia
COVID-19.
O convite me fez rever a minha experiência como profissional a partir do anúncio da pandemia no Rio de Janeiro, em março de 2020. Precisei recorrer à escrita para organizar meus pensamentos e esta é uma prática que recomendo para momentos de confusão mental: ESCREVER. Pois bem, relendo minhas anotações percebi que poderiam ser úteis a outras pessoas e as organizei no texto a seguir.
MINHAS
REFLEXÕES COMO ARTETERAPEUTA SOBRE A PANDEMIA
por
Flávia Hargreaves
A
minha construção de identidade como arteterapeuta sempre foi muito vinculada às
questões da Arte – linguagens, materiais e História da Arte – e
também fortemente marcada pelo ambiente de ateliê. Em um primeiro momento, com
o fechamento do meu espaço físico de trabalho (16/3/20), tudo isso parecia ter
caído por terra. E CAIU!
E foi justamente a Arte que me ofereceu saídas para seguir um novo caminho na Arteterapia. Fui buscar respostas nos movimentos artísticos, em especial a Arte Moderna, e percebi o quanto os artistas precisaram se revitalizar e reinventar nos momentos de crise coletiva, até mais dramáticos do que o que estamos vivendo desde 2020. O Dadaísmo, por exemplo, propõe que tudo o que está na vida pode ser matéria-prima para CRIAR COISAS, sejam elas entendidas como Arte ou não. Também trouxe deste movimento somado à experiência na Casa das Palmeiras[2] o caminho da expressão espontânea, livre.
Outra questão que veio imediatamente à tona foi o desafio das plataformas para vídeo- chamadas. A tecnologia não era algo distante da minha vida profissional ao longo de muitas décadas. Trabalhei muitos anos como designer e ficava muitas horas diante da tela do computador. Acreditava que a Arteterapia iria me liberar desta rotina. Mas tudo virou de ponta cabeça em 2020. E cá estou de cara para a tela e “olhando para a minha cara!”, o que torna a situação muito peculiar.
Voltando às plataformas, o primeiro teste foi com o Skype, que não funcionou bem com grupos, mas não posso colocar a culpa no aplicativo já que eu mesma não tinha certeza do que estava fazendo. Depois experimentei o Google Meet, com o qual não me adaptei, e finalmente cheguei à plataforma Zoom, que aos poucos fui aprendendo, estudando e testando com colegas. Hoje é a minha plataforma de trabalho.
A importância dos grupos de apoio
No primeiro semestre de 2020 mantive um grupo de arteterapeutas com encontros quinzenais para trocas de experiências no trabalho remoto. Este grupo com o tempo se diluiu, mas no início foi fundamental para que eu me mantivesse ativa e pudesse retomar meus cursos e atendimentos individuais e em grupo. Embora não fosse o foco das nossas conversas, colaborou muito na pesquisa de plataformas e novas ferramentas.
Atendimentos
em Arteterapia on-line e os materiais de trabalho
No início da pandemia, muitos profissionais trabalharam enviando kits com materiais para os seus clientes ou solicitando que os mesmos fossem adquiridos on-line. Eu não quis fazer nada disso. Quis lidar com a situação do "USE O QUE TIVER EM CASA", "NÃO SAIA DE CASA", "NÃO GASTE DINHEIRO". Foi o meu desafio particular, que como escrevi acima teve uma ajudinha dos dadaístas.
Aqui vai um exemplo: em maio de 2020, comecei a atender uma pessoa que não tinha nenhum material de arte em casa, nem mesmo sucata ou revistas que poderiam ser excelentes recursos expressivos. Recorri à leitura de contos, à musica e à escrita. No trabalho plástico utilizamos material de limpeza somado a uma ou outra possibilidade que surgia pela casa. No primeiro encontro usamos bombril, esponja, uma fita, uma cordinha e uma caneta vermelha. Me mantive fiel ao meu discurso. De lá para cá, partiu dela a aquisição de materiais de arte como argila, papel, lápis de cor e tintas.
Grupos em Arteterapia: transição do presencial para on-line
O Pintando Arcanos[3], grupo arteterapêutico que trabalha com os Arcanos Maiores do Tarô e que realizo ao lado da arteterapeuta Maria Teresa Rocha desde 2018, era presencial até março de 2020 e tinha como proposta expressiva a pintura em tela e o bordado. Tivemos que mudar no meio do caminho, no Arcano IX - O Eremita. Sincronicidades do Tarô. Neste caso específico pensamos em enviar kits com tela, tintas, pincéis e material para bordado, mas depois entendemos que não se tratava de manter o que era antes. Decidimos juntas acompanhar a radicalidade da situação. Eu, me valendo da experiência artística e da minha posição nos atendimentos individuais, defendi o uso da expressão livre. Essa foi a ideia: VIVER ESSE SUSTO, SE REINVENTAR. O grupo precisava viver isso em um ambiente terapêutico e criativo. E foi surpreendente! Os meios e os modos ampliaram na busca de novas possibilidades e isso reverberou na vida. Não é melhor, nem pior, é diferente e tão rico quanto o presencial. Não houve perda na criação de imagens nem na função terapêutica do grupo. Aliás, foi importantíssimo para as participantes a manutenção deste espaço aberto naquele momento.
Esta experiência positiva nos levou assumir o modelo on-line para este projeto e, aos poucos, eu e Maria Teresa, fomos incluindo na sensibilização a linguagem do Cinema e da Dança. Já utilizávamos as Artes Visuais e a Música, que foi revista dentro da nossa nova dinâmica de trabalho. As linguagens da Arte foram se tornando cada vez mais abrangentes e o trabalho tem se ampliado a cada edição. Este foi um salto possível no modo remoto. Em setembro de 2020 iniciamos o primeiro grupo totalmente on-line e o feedback que temos tido é sobre a importância desta pausa criativa de sexta à tarde. Também foi possível romper barreiras geográficas e incluir quem estava longe. Tivemos integrantes de muitos estados brasileiros e duas dos EUA. Outro aprendizado importante nesta transição foi reconhecer a necessidade de termos uma pessoa nos dando suporte técnico na preparação e durante os encontros. Quem nos acompanha desde a 3a edição é Ana Gatti, que já havia participado da edição anterior como cliente e está concluindo os cursos de Psicologia e Arteterapia.
Concluindo
A Arteterapia é um lugar privilegiado de SAÚDE, ARTE, TROCAS, ACOLHIMENTO, DESCOBERTAS E RE-INVENÇÕES. Não importa se é “presencial” ou “remota”, mas é importante esclarecer que todas as atividades que realizo são AO VIVO, não são gravadas. Como disse Ângela Philippini em uma live e que gosto de citar, quando estamos ao vivo “estamos presentes com o nosso corpo, cada um na sua casa que também é real”!
Ao organizar as minhas anotações, muitas outras coisas me vieram à mente, como o resgate de antigas parcerias, novos amigos e o mais importante: um novo olhar sobre a profissão. Mas isso é assunto para outros posts.
[1] O encontro foi realizado em 8 de abril e o video está
acessível pelo link:
https://www.youtube.com/watch?v=fouOKK5rRdI&t=5s
[2] A Casa das Palmeiras é um
espaço de reabilitação psiquiátrica fundado em 1956 por Dra. Nise da Silveira
(psiquiatra), Maria Stela Braga (psiquiatra), Belah Paes Leme (artista
plástica) e Ligia Loureiro (assistente social).
[3] Saiba mais sobre o Grupo Pintando Arcanos -
http://flaviahargreaves.blogspot.com/p/pintando-ebordandotaro.html
Flávia Hargreaves é coordenadora do projeto artes.LOCUS - artes e desenvolvimento humano, Arteterapeuta AARJ 402, Professora de Ateliê de Artes e História da Arte aplicada à Arteterapia, Professora dos cursos de Formação em Arteterapia Ligia Diniz, Leiza Pereira e Baalaka. Graduada em Comunicação Visual e Licenciatura em Artes Plásticas (EBA-UFRJ), Formação em Arteterapia Ligia Diniz. Foi colaboradora da Casa das Palmeiras (2014-2018) e Casa Verde (2009).
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Muito interessante a sua proposta de se reinventar, utilizando materiais que tem em casa. Gostei muito do seu relato. Agradeço.
ResponderExcluirObrigada Silvia.
ExcluirExcelente reflexão. É na reinvenção, na busca de soluções que evoluímos. Grata pela partilha.
ResponderExcluirObrigada Sandra. Aprendemos no desequilibrio!
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