VER e REVER, LER e RELER
por Flávia Hargreaves
Coordenadora do artes.LOCUS
atelie.locus@gmail.com
Revisão de conteúdo por Regina Diniz
movimentorumoaocontato#ensaiofotográfico#flávia
Hargreaves#2009.
Ao longo de 2018, compartilharei
com vocês alguns achados significativos que ainda me instigam e
mobilizam. Hoje, trago um trabalho de 2009: MOVIMENTO
RUMO AO CONTATO, releitura de uma leitura.
Realizei o meu trabalho orientado pela ideia de
releitura de uma leitura. Parti da expressão sugerida e, em seguida, me
voltei para todos os pontos do livro que haviam me afetado criativamente e fiz
uma releitura poética, utilizando texto e
imagem.
Eu havia recolhido uma série de discos transparentes
que vinham como proteção nas embalagens de CD e DVD. Arrumei-os
sobre um espelho oval que, por sua vez, estava sobre
uma mesa e, a partir daí, realizei um breve
ensaio fotográfico buscando efeitos na transparência e nos reflexos. Também
buscava um ponto focal e queria me colocar na cena de modo que o meu olho e o
“olho” da câmera coincidissem com o centro do disco e o espelho refletisse tudo
de volta para o meu olho, a imagem me olhando de volta.
VER e REVER, LER e
RELER, ações próprias da idade madura, quando estes verbos tornam-se reflexivos
– VER-SE e REVER-SE, LER-SE e RELER-SE. Não estou ocupada com a gramática, mas
com a ideia de uma ação que se volta para o autor. O texto de hoje trata da
retomada da minha produção artística e da necessidade de
REVER-ME e de RELER-ME como artista e
arteterapeuta.
ARTISTA#ARTETERAPEUTA
Olhando para trás, percebo que a ARTETERAPIA ME
REAPROXIMOU DA ARTE. Minhas reflexões sobre o papel da Arte na Arteterapia têm sido fundamentais para esse processo de retomada artística... E, o que era uma
reflexão sobre a profissão do arteterapeuta, encontrou eco
na revisão da minha biografia, na qual estou engajada com o acompanhamento da
aconselhadora biográfica e artista visual, Daniella
Liu. Essas reflexões têm influenciado
positivamente o meu modo de fazer e pensar a Arte hoje, seja como artista, seja
como arteterapeuta.
Nesse processo de resgate,
foi possível lançar um olhar consciente sobre caminho percorrido e perceber
como a Arte, para mim,
sempre foi um caminho de autoconhecimento, um meio para reestabelecer o
equilíbrio emocional e para lidar com as minhas fragilidades e medos, promovendo
tanto um mergulho no meu mundo interno, quanto a
comunicação com o externo. Percebi que, desde
muito antes de ouvir falar em Arteterapia, eu já
experimentava o potencial terapêutico da expressão artística. Talvez
por isso, o meu olhar como arteterapeuta parta do olhar da artista.
REVIRANDO O BAÚ
Revirando o baú, vendo e revendo desenhos, fotografias,
pinturas e esboços, lendo e relendo rascunhos, ideias e projetos não
realizados, escritas poéticas, além de textos para estudo recolhidos ao longo
de muitos anos ... passeei pelas minhas
influências, meus gostos, pelas mudanças de
forma e de estilo, identifiquei longas pausas e
crises criativas ... e, na busca ansiosa por minhas imagens e pela artista que queria ser, me
perguntei: O que persiste?
O que ainda se mostra significativo? A resposta foi simples e continua simples:
a necessidade da
Arte é o que em mim persiste.
MOVIMENTO RUMO AO CONTATO
Em 2009, cursando Licenciatura em Artes Plásticas
(EBA-UFRJ), foi solicitado, na disciplina, Evolução das Artes Visuais II, ministrada por
Michelle Sales, que fizéssemos uma produção artística a partir da expressão, "MOVIMENTO RUMO AO CONTATO", retirada do
livro, Ato Fotográfico, de Philipe Dubois:
“[...] A fotografia é um movimento rumo ao contato, um movimento no
espaço e no tempo. [...] a fotografia
exibe em seu centro um espaço a ser transposto, um afastamento, uma separação. Se a fotografia é um
movimento rumo ao contato é porque em primeiro lugar ela se expõe como 'distância' e porque essa distância é inicial, incompreensível: 'um
longínquo’, por
mais próximo que esteja." (DUBOIS, 2012, p. 247-248)
SOBRE O PROCESSO
A linguagem escolhida foi a fotografia, mantendo
coerência com o livro de referência -Ato Fotográfico – e as ideias giravam em
torno da imagem gravada na retina, do escudo da medusa como espelho e da linguagem
fotográfica.
movimentorumoaocontato#ensaiofotográfico#flávia
Hargreaves#2009.
A partir das imagens, senti
necessidade de escrever e fiz um exercício, chamado em arteterapia, de “escrita criativa” ou
“escrita espontânea” –
prática que também encontramos na Arte Dadaísta e
Surrealista, cuja proposta é escrever livremente sem críticas ou retoques. Porém,
neste exercício, eu não partia do nada, mas de
um texto lido e relido e da experiência do processo de criação das imagens. A
escrita foi usada como um fechamento do processo criativo.
MOVIMENTO RUMO AO CONTATO
Movimento rumo à morte
Refletida no espelho
Petrificada pelo olhar
Impressa na retina
O olhar do homem
O olhar do aparelho
Apontam para o escudo
Acertam o espelho
Múltiplos olhares
Tentam driblar a morte
Morte que congela
Petrifica, eterniza
O instante do contato
Capturado, impresso
Imóvel, eterno
Descartável.
movimentorumoaocontato#escrita
poética e fotografia,: Flávia Hargreaves, 2009.
OUTRAS
INFLUÊNCIAS
Gostaria de citar outras influências na realização
deste trabalho que se situam além da leitura e da experiência solitária da
criação. Com relação aos materiais, meu interesse já se voltava para as transparências
e os espelhos, influenciada pela saudosa mestra,
Maria de Lourdes Mader Pereira, com quem costumava conversar sobre minhas
produções. Em sua casa, havia um conjunto de
cubos de acrílico coloridos com os quais brincávamos,
em uma espécie de canto de espelho, o que resultava em imagens magníficas de
serem observadas. Também estava mobilizada com a obra,
"Eyes and Mirrors" (1989-93), de Louise Borgeois (1911-2010), artista
que me aproximou da Arte Contemporânea.
CONCLUINDO
Escrevo para todos
aqueles que se afastam da Arte por não possuírem habilidades artísticas, como,
por exemplo, o domínio do desenho realista... Repito
que a arte não está atrelada a tais habilidades há mais de um século. O domínio
da técnicas dependerá do caminho que cada um decida percorrer na Arte, trata-se
de uma escolha. Considero que o exercício mais importante a se fazer seja a
experimentação na busca do SEU meio de expressão, além de manter uma relação
próxima e criativa com a Arte do seu tempo. Então, mãos à obra porque a Arte é para todos, e a Arteterapia pode ajudá-lo/a nessa jornada
criativa que é a busca de si mesmo!
Referências:
DUBOIS, Philippe. O ato
fotográfico e outros ensaios. Tradução de Marina Appenzeller. 1ª reimpressão.
Campinas: Papirus Editora, 2012.
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Excelente texto, Flávia! Com certeza, vou ver rever, ler e reler muitas vezes. Um abraço. Lila. (Um aparte: ele reacendeu sobremaneira a minha relação de autoconhecimento, estreitamente ligada à Arte.)
ResponderExcluirNamastê.
Que possamos nos beneficiar deste caminho de autoconhecimento. Obrigado!!
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