E ASSIM SE PASSARAM SEIS MESES

E ASSIM SE PASSARAM SEIS MESES

por Flávia Hargreaves

Revisão: Erika Kohler

Réveillon 2020 e Ato Criativo 1. Fotografias de Ricardo Mello.

Em 15 de janeiro de 2020, demos boas vindas ao Ano Novo com um texto muito bacana de Erika Kohler, que iniciava com uma citação de Clarice Lispector que dizia:

"Chega de velhas desculpas e velhas atitudes! Que o ano novo traga vida nova, como o rio que sai lavando e levando tudo por onde passa”. Hoje releio estas palavras com outros olhos e elas seguem verdadeiras. Tudo mudou e a nova vida exige novas atitudes.

No dia 26 de fevereiro, às 6h15, quarta-feira de cinzas, retomamos nossas postagens de conteúdo dando partida ao ano de 2020. No mesmo dia, às 11h44, o Ministério da Saúde [1] confirmava o primeiro caso de COVID-19 em São Paulo.

No dia 13 de março realizei uma palestra no Estúdio Praia Pixel, a convite de Ricardo Mello, sobre Arteterapia e Arte Contemporânea. Naquela ocasião, conversando com alguns profissionais, fiquei sabendo que alguns espaços já haviam fechado as portas e outros ainda não tinham clareza do que fazer.

Seguiu-se um período turbulento de desinformação.  E então, diante de todo o cenário que estava se formando, decidimos dar uma pausa nas atividades do ateliê LOCUS por tempo indeterminado, cancelando cursos e ateliês que estavam em andamento e outros tantos programados para iniciar nos próximos dias.

Como todos sabem, o que se seguiu foi um fechamento geral e tivemos que viver o luto de nossos projetos para 2020. E esta ainda seria a parte mais fácil, já que muitos de nós adoeceram ou perderam entes queridos. Veio a sensação de medo, paralisia, seguida de uma necessidade enorme de ser produtivo e criativo, apesar de tudo. Aos poucos as exigências foram perdendo a razão de ser, ficamos tristes novamente e o tempo mostrou o seu peso. Os rostos no Instagram mostravam o abatimento e a palidez da reclusão. Mas as coisas se acomodam, se ajustam e a Arte e a Criatividade foram convidadas para fazer parte das nossas vidas novamente, não mais como uma exigência, mas para nos equilibrar. Para nos fazer olhar para outras coisas além da COVID-19 e suas estatísticas duvidosas, das nossas perdas e das contas a pagar. 

Uma vez em que tudo havia paralisado, minha energia se voltou para a manutenção dos espaços virtuais do artes.LOCUS, como este blog. As publicações que seriam quinzenais passaram a ser semanais. Isto foi possível graças à colaboração de uma generosa rede de amigos arteterapeutas, artistas e educadores comprometidos com a arte e a criatividade. Deixo aqui o meu sincero agradecimento à Beatriz Abreu, Erika Kohler, Marcela Campbell, Maria Cristina de Resende e Isabel Cristina Pires.

Aos poucos o ambiente virtual foi parecendo mais amigável e os atendimentos puderam continuar, os estudos tiveram mais tempo na agenda, muitas trocas com colegas, muito apoio mútuo para finalmente ser possível a retomada dos cursos no formato on-line. E o primeiro deles iniciou no dia 24 de junho: Dadá e Surrealismo na Arteterapia. Em breve teremos neste novo formato o Grupo de Tarô - Pintando Artcanos e os cursos Colagem e Fotografia para práticas terapêuticas.

Entre perdas e ganhos 

Perdemos o ambiente do ateliê que tanto prezo, a profusão de materiais, a acerola na janela, a aproximação das pessoas, o abraço, o café compartilhado. Enfim, o estar junto desfrutando de um ambiente criado com tanto carinho.  Mas tudo isso é temporário apesar de não sabermos o tempo que vai levar. O próprio nome LOCUS se referia a este lugar bucólico do ateliê, mas chegou a hora de explorar novos LOCUS, mantendo seu foco no desenvolvimento humano através da arte, com atendimentos arteterapêuticos, ateliês, cursos e grupos de estudos.

Por outro lado, posso apontar alguns ganhos importantes, como por exemplo, a ampliação do público. A distância deixou de ser um obstáculo. Embora ainda exista o problema do fuso-horário, a questão do formato on-line facilitou não somente quem mora em outros lugares mas também cariocas que levavam horas no traslado. Agora, num passe de mágica, todos ficaram perto. Nesse sentido posso pensar no afastamento social promovendo uma aproximação não prevista.

Me aventurei em projetos que não teriam acontecido sem a pandemia como o Ato Criativo, que realizo em parceria com Amanda Medeiros (Terapia pela Arte) e Ricardo Mello (Estúdio Praia Pixel). Descobri modos de dar continuidade a projetos já iniciados como o "Grupo de Tarô - Pintando Arcanos", que realizo em parceria com Maria Teresa Rocha e o curso "Fotografia para práticas Terapêuticas", em parceria com Ricardo Mello. Além das lives no Instagram e Zoom a convite de Maria Cristina Resende, Amanda Medeiros e Bárbara Pessanha. Esta experiência fez cair por terra preconceitos sobre o modo on-line, e pude vivenciar a construção de vínculos mediados por vídeo.

Com relação aos atendimentos em arteterapia, me deparei com muitas incertezas: Como criar novos modos de trabalhar com a arteterapia? Como criar vínculo com o cliente on-line? Como valorizar o nosso trabalho neste novo modelo? Como medir a sua eficácia? Ainda estamos diante de um desafio e de um caminho que se abre aos poucos diante de nós. Considero importante não passarmos por esse processo sozinhos. Devemos construir uma rede de apoio para trocar ideias e experiências, compartilhando nossos erros e acertos.

Acredito que passada a necessidade de relacionamentos remotos imposta pela pandemia, o espaço conquistado nesta fase irá perdurar e crescer. Em breve vamos poder nos encontrar pessoalmente e nos abraçar também, mas com certeza vamos seguir nos encontrando virtualmente. Sabemos que estas plataformas já estavam disponíveis, que o home office não é nenhuma novidade, mas agora todos experimentaram e muitos, como eu, se surpreenderam.

E você?! Como tem passado por essa quarentena?!

Faço um convite a todos os arteterapeutas, artistas e professores que compartilhem conosco sua experiência profissional neste período de isolamento social para serem publicados neste espaço a partir de agosto.

[1] https://www.saude.gov.br/

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#quarentena

#fiqueemcasa

Flávia Hargreaves

Coordenadora do projeto artes.LOCUS - artes e desenvolvimento humano, Arteterapeuta AARJ 402, Professora de Arteliê de Artes e História da Arte aplicada à Arteterapia, Professora dos cursos de Formação em Arteterapia Ligia Diniz, Leiza Pereira e Baalaka. Graduada em Comunicação Visual e Licenciatura em Artes Plásticas (EBA-UFRJ), Formação em Arteterapia Ligia Diniz. Foi colaboradora da Casa das Palmeiras (2014-2018) e Casa Verde (2009). 

@ artes.locus

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