ARTE E NATUREZA: O PODER DA OBSERVAÇÃO

Por Flávia Hargreaves
fmhartes@gmail.com

 #flordemaio#estudos#aquarela#araras#fláviahargreages.#2018.

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SOBRE DESENHOS DE OBSERVAÇÃO.

#estudos#desenhoartistico 1#carvão#eba#ufrj#fláviahargreages.#1983.

Mais uma vez revendo minha história, buscando a mim mesma nas minhas imagens, revirando pastas e gavetas da mapoteca do escritório, me deparo com meus primeiros desenhos a carvão realizados em 1983, nas aulas da EBA (Escola de Belas Artes – UFRJ). Os objetos desenhados não variavam muito. Eram tijolos, garrafas e vasos sobre um panejamento que, além de dar um toque acadêmico à composição, completava o meu “terror” diante do desafio de reproduzir o que via. Sim ... admito que desenhar a realidade sempre me pareceu assustador e ainda havia o desconforto do julgamento, da avaliação, da comparação, etc. Entrar em contato com estes desenhos HOJE me afetou profundamente. Revê-los provocou em mim uma sensação de prazer inesperada, reconhecendo neles uma beleza que não fui capaz de ver na minha adolescência. Fiquei surpresa e descobri uma BELEZA DELICADA NÃO RECONHECIDA. Na sequencia, vasculhando as pastas, surgiram os desenhos de modelo-vivo, corpos nus ou semi-nus, mas essa é uma história sobre a qual pretendo me debruçar posteriormente. Mas vale ressaltar o que DESENHAR tijolos, corpos nus ou a natureza, tema desta reflexão, tem em comum: a exigência da OBESERVAÇÃO APURADA, o conhecimento do objeto pela observação. Seja um objeto isolado ou uma cena, o olhar “pula” do todo (contexto) ao detalhe (componente), o olhar vai e volta e a mão vai adquirindo habilidade. É preciso reconhecer a dificuldade de VER e DESENHAR realisticamente e, justamente por isso, pode ser um exercício surpreendente para todos aqueles que se disponibilizarem a essa experiência. Em tempos de déficit de atenção e de prazeres instantâneos, “gastarmos” tempo observando algo, nos determos objetivamente ao que está diante de nós e colocar em um desenho torna-se uma aventura enriquecedora e, talvez, necessária. Fica a dica. E mais: saibam que a frustração virá e será apenas um dos obstáculos a serem reconhecidos como parte do processo.

E ERAM FLORES...

#florcomestivel#caputinha#hortaorganica#annasaraiva#teresopolis#flaviahargreaves#2015.

O contato com os primeiros desenhos que citei acima, fez com que sentisse VONTADE de retomar os exercícios de observação, olhar para o que estava diante dos meus olhos, e ... ERAM FLORES. Passei a olhá-las, tocá-las, cheirá-las, comê-las ... precisava acordar os meus sentidos, precisava me demorar, conhecer aquela flor a partir da experiência sensível. Nachmanovitch, em seu livro Ser Criativo, sugere um exercício de dizer SIM ao objeto a ser desenhado, e esta foi a minha forma de dizer SIM.

#flordemaio#estudos#lapisdecor#araras#fláviahargreages.#2018.

Sincronicamente, tive oportunidade de entrar em contato com duas teorias que me fizeram [Re]OLHAR a realidade. A primeira foi TEORIA DAS CORES DE GOETHE, no curso ministrado por Daniella Liu, em fevereiro de 2018, onde o estudo das cores se baseia na percepção, na observação. É preciso VER as cores para entendê-las. A segunda foi o MÉTODO COGNITIVO DE GOETHE, organizado por Rudolf Steiner, também pelas mãos de Daniella Liu. Colocando de uma forma bastante simplificada, a teoria diz para observarmos as formas a partir da OBSERVAÇÃO DA NATUREZA, descobrindo como aquele organismo se desenvolve, qual o seu movimento. E, novamente me deparo com a questão de que é preciso VER para conhecer, e conhecer para DESENHAR, e, aprofundando, desenhar para captar a ESSÊNCIA para então CRIAR. O estudo deste método entrou para a minha lista de temas a serem aprofundados, mas mesmo antes do estudo teórico, parti para a ação de OBSERVAR e DESENHAR. Descobri um novo modo de olhar as formas que a natureza me oferecia, como, por exemplo, as acerolas na varando ou a plantinha no vaso. Busquei o seu ritmo, as suas particularidades, acompanhando dia-a-dia o seu desenvolvimento. Este exercício me fez entrar em contato com a GENEROSIDADE do desabrochar de uma flor ou da geração de um fruto, abrindo novas percepções e perspectivas diante da vida e seus ciclos naturais.

#arte#natureza#flores#amigos#teresopolis#araras#copacabana#2015#2017#2018.

Aos poucos, fui tomando consciência da minha necessidade de BELEZA NATURAL e como a natureza foi fundamental na minha retomada saudável da arte e, em particular, do DESENHO. Claro, que tudo é um processo e não acontece de repente. A primeira porta se abriu em 2015 no ateliê da saudosa amiga e artista Anna Saraiva, em Teresópolis, onde compreendi a força do “lugar” para criar. Seu ateliê era uma espécie de jardim de inverno, rodeado por janelas que se abriam para uma paisagem de roseiras e árvores frutíferas. A segunda porta se abriu em 2017, quando reabri meu ateliê em Copacabana com surpreendentes acerolas na varanda, já citadas, vista para grandes árvores e assíduas visitas de borboletas, passarinhos, micos e ocasionais tucanos. Sim ... esses lugares mágicos existem até em Copacabana. A terceira porta está se abrindo neste momento com a resignificação dos desenhos de observação de organismos vivos, que me ensinam que É PRECISO TER TEMPO. Também tenho aprendido a não focar na finalidade, no para que serve isso ou aquilo, mas a observar como aquilo se desenvolve e aceitar o tempo necessário para que cada fase se conclua. 

#estudos#aquarela#copacabana#fláviahargreages.#2018.

Hoje, vivenciando a terceira porta, seja no meu ateliê ou em lugares especiais cercados de natureza faço meus exercícios desenhando folhas e flores e, simultaneamente, entrando em contato comigo mesma como um ser natural, que pode ser belo e generoso, que nasce, se desenvolve e vai morrer. Minha intenção ao compartilhar essa experiência é deixá-lo instigado, com vontade de retomar ou iniciar esta jornada de desenhar a partir da observação minuciosa do mundo ao seu redor, em especial da natureza. Então, pegue seus papéis, lápis, tintas, o que tiver à mão e lance um olhar renovado para o mundo e para si mesmo. Boa jornada e compartilhe essa ideia!

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Comentários

  1. Flávia, obrigada por compartilhar suas experiências com tanta forca e sensibilidade! Experienciar e desenvolver este olhar é um exercício desafiador, mas extremamente necessário e na minha percepção, transborda para além do proprip exercicio. É um movimento de gratidão à vida e tudo que elas.nos proporciona de Belo e saudável. Bjs

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    1. Obrigada Tania. Sim transborda para além do exercício, acredito que conseguir "parar" e "olhar" já se coloca como um desafio.

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  2. Texto inspirador, obrigada por compartilhar.senti uma imensa vontade de desenhar, trabalhar o VER e o TRANSVER.

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    1. Então mãos a obra!!! Quero que todos fiquem inquietos e partam para a ação!!! Obrigada amiga.

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  3. Quele Pícoli23/05/2018, 05:48

    Você me inspira a me manter firme no propósito. Grata por compartilhar seu cotidoano.

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    1. Obrigada a você Quelle, aliás vc foi uma das pessoas que trouxe a questão do desenho realista que eu havia deixado lá atrás.

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  4. Comentário enviado por Sônia Guimarães (via facebook, 23/05/18): Li todo seu texto. Gratidão à natureza, penso, é para poucos, mas quando pensei em morder a linda pera, parei , olhei, vi. Obrigada.

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  5. Ler esse texto me fez refletir sobre a insegurança em me aventurar nos desenhos de observação. Ao mesmo tempo, abriu meu olhar para perceber as riquezas que envolvem essa prática. Obrigada por compartilhar essas experiências carregadas de sensibilidade e delicadeza!!

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    1. Obrigada Isadora. Fico feliz em ter colaborado na sua busca pelo desenho e que você persista nesse caminho.

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  6. É realmente de imaginar o quanto a vida pode ser generosa ao me deparar com este texto que escreveu. O quanto me ajudou a sua descrição das suas angústias ao iniciar seus estudos e perceber, no isolamento de minhas tentativas, que não estou sozinho e me estimular a continuar. E, dentre tantas outras questões, principalmente a fala sobre o tempo. Questão para mim primordial agora. O quanto agir, o quanto se esperar, o quanto se guardar para que as coisas boas se construam em nossas vidas ? São poucas as palavras para lhe agradecer do tanto que me tocou seu texto. (Reproduzirei tal comentário no Facebook. Acho que mais pessoas precisam ler esse texto).

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    1. Obrigada Davi. Suas palavras também me estimulam a continuar escrevendo e compartilhando minhas reflexoes acerca do fazer e pensar a arte como parte fundamental para a vida.

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  7. Gostaria de agradecer a todos pelas mensagens e comentarios, publicos e privados, que tenho recebido a partir do texto ARTE E NATUREZA: O PODER DA OBSERVAÇÃO. Quando escrevo não tenho noção do quanto o texto será mobilizador para quem o lê. As vezes me questiono sobre o sentido e a validade do mesmo, sou muito crítica. E, por isso, é sempre uma surpresa o retorno que recebo. Agradeço emocionada e com dificuldade de escolher as palavras certas, elas nao parecem traduzir o que estou sentindo.

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  8. A Vida não é cruel, é generosa : dá em dobro aquilo o que oferecemos a ela. Seja lá o que for...

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  9. Querida Flavia, hoje falei muito de você, falando de artes é claro. Eu agradeço por estar sempre compartilhando com tanta clareza e se permitir experimentar um olhar tão apurado para tudo e todos a sua volta. Lindo este momento.

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    1. Obrigada Nasare. Tambem falo muito em você e muito animada com os 12 trabalhos de hercules. Isso deve estar no meu mapa kkkk.

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  10. Comentário enviado via e-mail em 8/6/18 por Martha Pires Ferreira: "Belo trabalho de observação e exercício de criar com sensibilidade o que a Natureza convida. Flavia, seu texto/registro está ótimo e preciso. Desenhar é desafiar - simples e complexo ao mesmo tempo. Tensão e prazer se misturam para nos deixar felizes com o resultado final. Grande abraço florindo a Vida! martha"

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  11. Comentário enviado via Facebook em 11/06/18 por Cristiane Gerolis de Moraes: "Este texto retrata a sua essência... você com sua simplicidade me fez ver da janela do ateliê a beleza que existia nas folhas secas da copa das árvores .... e sua importância no processo...."

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  12. Este comentário foi removido pelo autor.

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  13. Flávia. Não havia lido o texto ano passado, então reeditá.lo foi tudo7 de bom. Muitas imagens passaram pela minha cabeça enquanto lia seu texto, voltei a minha infância, em que, desenhar era um grande prazer solitário, gostava de ficar por longo tempo assim, depois recordei a adolescência em que, copiar o objeto era um grande desafio. Talvez nesta fase o objetivo fossem as telas, já que meu pai as pintava. Permaneci nos desenhos copiados durante anos não tendo alguns feito alguns para agradar minha filha que colecionava desenhos dos heróis da época da infância dela. Hoje não tenho mais nehum desenho dos que fiz comigo. Houve tempo que me arrisquei na tela, com a supervisão de uma amiga, "Nega Scarambone", com ela passei a reeditar pinturas famosas trazendo meu olhar sobre elas para a tela. Foi uma experiência ímpar, me transportava para outra dimensão, era uma expansão interior. Nesse processo que durou dois anos, talvez menos um pouco, vivenciei esta sensação semanalmente. Agora passados alguns anos seu texto me inspira novamente.
    Outro ponto que me chamou atenção foi relacionado ao déficit de atenção. Começarei a observar com mais atenção me propondo a realizar no setting, percebendo que nesta atividade um grande auxílio para lidar com pessoas com este diagnóstico. Vou colocar meu projeto pessoal para que em 2019 observe mais, me conecte mais, interagindo com a natureza e proporcionando o mesmo contato ao paciente.

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  14. Obrigada pelas dicas preciosas, Flávia. Embora não seja, nem de longe, uma desenhista tomei pra mim alguns dos seus olhares sobre as coisas e as flores. <3

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